Loading

Esperança para quem aguarda adoção Sancionada em novembro, nova Lei diminuiu prazos dos processos. Terá prioridade quem aceitar adotar grupo de irmãos.

Débora Brito, da Agência Senado

Publicado em 19/12/2017

O Senado levou apenas 42 dias para aprovar, em 25 de outubro, um projeto de que busca justamente amenizar a angustiante espera de crianças e candidatos a pais adotivos. Quase um mês depois, a nova lei (13.509/2017) foi sancionada pelo presidente Michel Temer, com alguns vetos ainda não examinados pelo Congresso Nacional.

Enquanto a ação legislativa e a sanção se desenrolavam, cerca de nove mil crianças e jovens aguardavam na fila para serem acolhidos por uma família. Em contrapartida, aproximadamente 43 mil possíveis pais conferiam suas posições na fila para recebimento de crianças.

Segundo o Cadastro Nacional de Adoção, 62% das crianças têm entre nove e 17 anos, enquanto 95% dos candidatos a pais preferem crianças até oito anos de idade. Destes, mais da metade não aceita ficar com os irmãos do adotando.

— Eu percebi que era um projeto muito maduro e reformulado depois de ampla discussão. Quando isso acontece, o ideal é colocar logo em votação. Até porque, se qualquer coisa fosse mudada, a matéria teria de voltar para a Câmara, o que faria aumentar a demora — explica a senadora Marta Suplicy (PMDB-SP), referindo-se ao PLC 101/2017 (número recebido no Senado), de autoria do deputado Augusto Coutinho (SD-PE).

O projeto resultou de uma consulta pública feita pelo Conselho Nacional da Criança e do Adolescente (Conanda) em 2016. O levantamento durou 90 dias e o texto obtido a partir das contribuições serviu de inspiração para a proposição de Coutinho, mas igualmente para um projeto, ainda em análise no Senado: o PLS 223/2017, apresentado pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Marta Suplicy (PMDB-SP), relatora do PLC 101/2017, observa que muitas crianças em idade preferencial para adoção envelhecem à espera de novo lar e acabam entrando na pré-adolescência ou adolescência com chances remotas de conseguirem ingressar em uma família.

Sandra Lúcia, servidora pública do Distrito Federal, habilitada a adotar uma criança desde 2014, relata o longo caminho que já percorreu para realizar o sonho de ser mãe:

— Eu completei 3 anos de habilitação no dia 24 de novembro e estou à espera do meu sonho ser realizado, não importando se será menino ou menina. Para mim o importante é ser mãe.

Uma das mudanças principais da nova lei, que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é a redução dos prazos que envolvem todo o processo de adoção e prioriza grupos de irmãos e crianças com problemas de saúde, dando celeridade ao trâmite processual.

O cumprimento dos prazos previstos na nova lei, no entanto, gera dúvidas. A juíza Joyre Sobrinho, titular da Vara de Família e Infância da Comarca de Novo Gama (GO), alerta para a necessidade de investimento na estrutura do Judiciário se o objetivo é o cumprimento dos prazos.

— A maioria das Varas de Infância do Brasil inteiro está defasada. O processo de adoção é delicado e tem inúmeras variáveis. Então, às vezes o andamento não é o ideal por falta de estrutura — pondera a magistrada.

O advogado Hugo Teles, do Grupo Aconchego, que dá apoio à convivência familiar e comunitária e tem projetos voltados à adoção, concorda com Joyre Sobrinho:

— O Judiciário agora precisa se aparelhar. Tem que se estruturar com todo o sistema da Infância e Juventude. Caso contrário, esses prazos certamente não serão cumpridos.

PRAZOS

Atualmente, há mais de 55 mil crianças e adolescentes vivendo em instituições de acolhimento, à espera da conclusão do processo de destituição do poder familiar, que é o desligamento da criança de sua família natural. A lei veio para mudar essa situação, trocando a prioridade para a volta da criança à família de origem em prol do interesse da criança e do adolescente em se inserir numa família estruturada.

O período máximo de acolhimento institucional, em abrigos, não poderá se prolongar por mais de um ano e seis meses, salvo por autorização de um juiz. A duração máxima do estágio de convivência que antecede a adoção em território nacional, antes sem prazo, foi fixada em 90 dias.

— São comuns histórias de crianças que chegam ao abrigo, passam o início da adolescência e com 18 anos têm que ir embora sem que sua situação seja definida. Então, quando a lei estabelece prazos, ela define a situação — explica Hugo Teles.

— Essas crianças que estão nos abrigos gostariam de ter um lar, mas é tanta burocracia que elas não conseguem ser adotadas. Demora tanto tempo para chegar ao cadastro nacional, que elas crescem e muitas famílias se desinteressam desse processo. Essa nova lei foca nesse gargalo para agilizar os procedimentos relacionados à destituição do poder familiar e à adoção de crianças e adolescentes — enfatiza Marta Suplicy.

Prazos reduzidos para o processo de adoção são uma das mudanças trazidas pela nova lei (foto: Lia de Paula/Agência Senado)

Já o prazo para que as famílias inscritas se habilitem à adoção, também fica limitado a 120 dias, prorrogáveis por igual período mediante decisão judicial. É aí que o então pretendente à adoção será reconhecido como pai e o adotando como filho. Antes, não havia um tempo determinado e famílias reclamavam da incerteza.

No caso de adoção internacional, a lei determina que esse prazo deverá oscilar entre 30 e 45 dias, prorrogáveis uma única vez, também por decisão judicial.

VETOS

Algumas tentativas de encurtar os passos para adoção, porém, foram vetadas pelo presidente Michel Temer, quando da sanção da Lei 13.509/2017. O Planalto vetou dispositivos como o que autorizava o cadastro para a adoção de recém-nascidos e crianças mantidas em abrigos que não fossem procuradas pela família biológica em até 30 dias.

O presidente considerou o prazo “exíguo” e “incompatível” com a sistemática do Estatuto da Criança e do Adolescente sobre a busca da chamada família extensa, da qual fazem parte avós e tios.

“Além disso, é insuficiente para se resguardar que a mãe não tenha agido sob influência do estado puerperal [pós-parto] e que, assim, possa ainda reivindicar a criança”, justificou o presidente.

Prazo de 30 dias para inclusão de crianças no cadastro para adoção foi vetado pela Presidência da República (foto: Lia de Paula/Agência Senado)

O projeto enviado a Temer também buscava obrigar que todo jovem inserido em programa de acolhimento familiar ou institucional teria sua situação reavaliada, no máximo, a cada três meses. “O governo federal entendeu que, embora louvável, a redução do prazo para reavaliação representaria sobrecarga às atividades das equipes interprofissionais dos Serviços de Acolhimento, podendo comprometer a realização e a eficácia do trabalho em outras tarefas essenciais”, contrapôs o Palácio do Planalto.

Para Hugo Teles, esse trecho vetado prejudica a eficácia da Lei:

— Eu critico esse veto porque ele vai na contramão do espírito da lei. Se a falta de pessoal é justificativa para que o ideal não ocorra, então o legislativo deveria se contentar com a realidade atual.

O projeto havia estabelecido também que interessados em adotar não podiam ser participantes do programa de apadrinhamento. Nessa modalidade de relação com crianças e adolescentes, paralela ao programa de adoção, as famílias mantém períodos de convivência intermitentes e contribuem para a educação ou o entretenimento dos apadrinhados. Esse trecho foi suprimido pelo presidente, sob a justificativa de que eliminar os padrinhos do rol de pretendentes traria prejuízos a crianças e adolescentes com remotas chances de adoção.

Vetos da lei Nº 13.509

Art. 19, inciso 1: tratava da reavaliação da situação de crianças e adolescentes, cadastrados nos programas de acolhimento familiar e institucional, a cada 3 meses.

Justificativa do veto: O presidente da República afirmou que a reavaliação poderia gerar sobrecarga para as equipes responsáveis por esses casos.

Art. 19-A, inciso 6: dizia que o não comparecimento de pais ou representantes familiares, em audiência marcada para discutir a guarda de crianças que estivessem em abrigos, poderia acarretar em decisão judicial para que elas ficassem aptas à adoção.

Justificativa do veto: O dispositivo apresenta incongruência com o proposto § 4o do mesmo artigo, que determina a extinção, e não a suspensão, do poder familiar. Além disso, para a colocação da criança para adoção, seria necessário alcançar-se também o poder familiar do pai, não prevista pelo dispositivo, que só aborda o poder familiar da mãe.

Art. 19-A, inciso 10: Seriam cadastrados para adoção recém-nascidos e crianças acolhidas não procuradas por suas famílias no prazo de 30 dias, contado a partir do dia do acolhimento.

Justificativa do veto: O prazo de 30 dias estipulado pelo projeto de lei foi considerado “exíguo”. Estresses ou outras manifestações pós-parto podem afetar a decisão da mãe de abandonar a criança. Arrependida, ela pode mais tarde reivindicar a guarda do filho.

Art. 19-B, inciso 2: o projeto previa que poderiam participar do programa de apadrinhamento afetivo (projeto em que pessoas mantém vínculos com crianças em situação de risco) maiores de 18 anos e que não estivessem inscritos em cadastros de adoção.

Justificativa do veto: O dispositivo pode implicar em prejuízo às crianças com chances remotas de adoção, por vedar quem esteja inscrito em cadastros de adoção.

POLÊMICA

O artigo polêmico da nova lei é o que dá à autoridade judiciária o poder de nomear peritos quando não houver equipes disponíveis para realizar estudos psicossociais ou quaisquer outras espécies de avaliações técnicas exigidas no processo de adoção. Essa foi a saída encontrada para não interromper o andamento dos processos.

O desconforto gerado pelo artigo 151 se dá porque o trâmite da adoção é acompanhado por profissionais especializados em psicologia, serviço social, entre outros. Essas equipes multidisciplinares trabalham inclusive junto às crianças e adolescentes nos abrigos, preparando-as para começarem uma nova vida.

Joyre Sobrinho teme que essas medidas supletivas se tornem regra e o problema real siga sem o devido olhar.

— Isso é uma forma de o Estado se eximir do seu papel de prover de forma satisfatória a estrutura da equipe multidisciplinar — adverte a juíza.

O Conselho Federal de Psicologia foi contrário a esse artigo, por acreditar que a nomeação de outros profissionais sem o conhecimento profundo do tema é equivocado e que essas contratações poderão ser prejudiciais.

— Quando se trata de adoção, isso envolve situações complexas que exigem análises acuradas de um profissional que entende profundamente dessa questão tão delicada. Todo esse cuidado é justamente para não corrermos o risco de causarmos danos a essas crianças e adolescentes — afirma Iolete Ribeiro da Silva, conselheira do Conselho Federal de Psicologia.

Nova lei permite que o juiz nomeie peritos para avaliação psicossocial das crianças (foto: Lia de Paula/Agência Senado)

Segundo o advogado do Grupo Aconchego, há a realidade das capitais, que contam com varas da Infância e da Juventude e com pessoal qualificado, e há a realidade do interior do país, áreas nas quais há municípios com uma única vara. Ali, o juiz decide sobre casos de família, da esfera criminal, da esfera cível e até de processos com repercussão no âmbito federal. Não há uma equipe técnica à disposição desses magistrados para os casos de adoção.

— Nesses casos, eu acredito que o artigo é muito positivo. Permite que em uma situação sem estrutura como essa, o Juiz possa contar com profissionais de sua confiança — pondera Hugo Teles.

CLT

A Lei 13.509/2017 também altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ao estender à pessoa que adotar uma criança as mesmas regras de estabilidade trabalhista acessíveis aos pais sanguíneos. O texto garante segurança a trabalhadores que conseguiram guarda provisória, proibindo a dispensa durante esse período (como já ocorre com grávidas) e estabelee licença-maternidade de 120 dias a mães adotivas, inclusive no caso de adolescentes. Até então, a regra só tratava expressamente de crianças. A norma deixa claro do mesmo modo que os descansos intrajornada para amamentação também valem para mulheres com filhos adotivos, quando o bebê tiver até seis meses.

Saiba Mais

Cadastro Nacional de Adoção

Passo a passo da adoção

Portal da Adoção

Adoção Brasil

Organismos de adoção

Ministério da Justiça

Report Abuse

If you feel that this video content violates the Adobe Terms of Use, you may report this content by filling out this quick form.

To report a Copyright Violation, please follow Section 17 in the Terms of Use.