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Passo a passo a gente faz o bem 27ª Caminhada da Fraternidade em Teresina leva cerca de 15 mil pessoas a marcharem com alegria em um novo começo

Por Maria Clara Estrêla e Nathalia Amaral

O tempo de festa e união voltou após dois anos permeados pelo medo e pela necessidade de distanciamento. No lugar do choro, o sorriso. No lugar do luto, o renascimento. No lugar da dor, a esperança na fé e na renovação. A hora é de dar as mãos, colocar o sorriso no rosto, celebrar a vida com alegria e dar os primeiros passos para um novo começo. Na fraternidade somos mais fortes e, caminhando juntos, chegaremos mais longe. Caminhando com alegria nossos passos cheios de amor.

A celebração da alegria e dos primeiros passos rumo a um recomeço teve data e local marcado em Teresina. No último sábado, 11 de junho, cerca de 15 mil pessoas se reuniram na Avenida Frei Serafim para a 27ª Caminhada da Fraternidade. Com o tema “Alegria, nossos passos cheios de amor”, este ano o evento voltou a acontecer na modalidade presencial após dois anos sendo realizado de forma virtual em razão da pandemia de covid-19.

Mas nem mesmo durante os períodos mais críticos da crise sanitária essa alegria deixou de existir. Mesmo vivendo sob uma cortina de sofrimento pela perda de entes queridos e pelo afastamento forçado daqueles que amamos, ainda fomos capazes de resistir e mostrar que contra a desesperança, o sorriso sempre vai ser o melhor remédio. E a vontade de estarmos juntos novamente em presença física, caminhando de mãos dadas e celebrando a vida foi que nos trouxe até aqui.

O mesmo ponto de partida: o adro da Igreja São Benedito, em Teresina. Uma largada diferente: sorrisos escondidos atrás das máscaras. Mas ainda assim, sorrisos. A felicidade em poder se unir novamente para fazer o bem se traduz em um sentimento muito maior: a fraternidade que não arrefeceu em momento algum mesmo nos tempos mais sombrios. A fraternidade de quem caminha lado a lado passos repletos de amor, acolhimento e solidariedade.

Há quem diga que a pandemia tem servido, ainda que de um jeito cruel, para testar a nossa fraternidade e nos tornar pessoas melhores. Participar da Caminhada da Fraternidade 2022 é, portanto, manifestar essa transformação. Um momento de agradecer com alegria pela vida e por aquilo que temos de bom para celebrar. O sorriso no rosto da secretária Elisângela Costa reflete bem estes sentimentos.

“Eu sempre participei da caminhada e esse ano é um sentimento novo para mim. É tanta saudade de estar aqui que chega até a ser indescritível podem estar perto de quem a gente gosta e de quem sempre caminhou com a gente. A gente passou por tanta coisa, tanta provação e eu acho que mais que celebrar, a gente está aqui também para fazer com que outras pessoas tenham o que comemorar e para agradecer”, diz Elisângela.

Ela agradece pela vida. Em setembro de 2021, Elisângela sofreu um acidente e precisou colocar dois pinos na perna para voltar a ter mobilidade plena. E mesmo depois disso, ela sequer cogitou não participar da Caminhada da Fraternidade neste recomeço. Acompanhada do sobrinho, João Mateus, e da irmã, Milena, ela manteve a tradição da família de pé e viva em cada passo dado ao longo do trajeto.

“Eu tive medo de não poder mais fazer as mesmas coisas de antes, inclusive caminhar. E hoje estou aqui passinho a passinho e arrepiada de estar no meio de tanta gente e feliz. É uma esperança, um respiro no meio do caos. Renova nossa esperança e nossa alegria”, finaliza Elisângela.

"É uma esperança, um respiro no meio do caos", afirma Elisângela Costa

Esperança foi a palavra que regeu os caminheiros da 27ª Caminhada da Fraternidade. Somada à alegria do recomeço, a animação que tomou de conta da Avenida Frei Serafim contagiou inclusive quem nunca tinha participado do evento. Dando seus primeiros passos na Caminhada da Fraternidade, o estudante Christian de Oliveira conta que pretendia ter participado na edição de 2020, que teve que ser cancelada na modalidade presencial por conta dos casos crescentes de covid. Os dois anos na expectativa de poder participar com o pé na avenida tornaram o momento ainda mais memorável e gratificante.

“A gente vê que tem um pessoal bastante animado e isso anima a gente. É bom ver as pessoas sorrindo e felizes ainda mais nesses tempos que a gente vive. Tem tanta gente sofrendo por causa dessa doença que eu acho que para quem está aqui, torna tudo muito maior. Eu acho que a gente caminha por nós mesmos e por quem não pode estar caminhando hoje. Quer dizer, nossos passos não são só nossos, eu acho. A gente traz todo mundo mesmo que só em pensamento, eu acho”, afirma Christian.

“Caminhada é movimento, mas também é ajudar ao outro”

Não importa a velocidade da marcha: mais lento, mais rápido. Os que caminham nos braços, outros que caminham sobre rodas.... Todos eles seguem pela avenida com um mesmo propósito: manifestar sua solidariedade e a vontade de poder ajudar ao outro. O corpo é uma máquina que não foi feita para ficar parada. E quando ela se movimenta com um propósito nobre, o retorno é muito mais que o bem-estar físico. O sorriso no rosto traduz a alegria de poder se posicionar em prol de quem amamos.

Clara Pereira participa da Caminha da Fraternidade desde a primeira edição. Hoje casada e mãe de dois filhos, ela passa para as futuras gerações a tradição da família e explica aos pequenos da melhor maneira possível no que se traduz a Caminhada: “é um movimento que a gente faz com o corpo e também com a nossa solidariedade em que a gente manifesta nossa vontade de ajudar aos outros”, diz.

Para ela, participar com a família da 27ª Caminhada da Fraternidade após dois anos sem poder estar no evento presencialmente é felicidade, alegria e realização. A animação dos demais caminheiros e o propósito pelo qual estão todos reunidos também colaboram para o sentimento de acolhimento que Clara externa. “A gente se sente confortável de estar aqui mesmo com todas as restrições de máscara e distanciamento. Porque sabemos que estamos juntos em prol de algo muito maior. Eu acho que é esse algo, esse poder de levar alegria para outras pessoas que torna tudo mais especial”, finaliza Clara.

E é de passinho em passinho que chegamos lá. A frase é da senhora Ivonete Lopes, que participa da Caminhada da Fraternidade também desde sua primeira edição, mas que neste ano de 2022 enfrenta o percurso em uma cadeira de rodas. Vítima de um acidente automobilístico em 2019, ela tem dificuldades de locomoção e depende do equipamento para conseguir fazer o percurso completo. Apesar dos pesares, nesta caminhada do recomeço, ela chegou à avenida com um sorriso no rosto e encontrou nos passos do filho, Fábio, o apoio que precisava para seguir sempre em frente.

“Esse ano o que me move é a gratidão. Eu estou com meus movimentos limitados, mas minha fé em Deus e minha vontade de ajudar ao próximo é que me movem. Eu sou perseverante e quero levar essa mensagem de perseverança a quem precisa. A gente precisar enfrentar as adversidades com alegria mesmo que as coisas pareçam muito difíceis. No fim, sempre a gente consegue”, finaliza dona Ivonete.

“Caminhar para ir ao encontro da Fraternidade”

A 27ª Caminhada da Fraternidade teve sua largada por volta das 18 horas do sábado (11). Mas antes dos caminheiros se unirem para percorrerem o trajeto até o Teresina Shopping pela Avenida Frei Serafim, receberam a mensagem proclamada durante a Santa Missa presidida pelo arcebispo de Teresina, Dom Jacinto Brito. Verbalizando o amor, a alegria e a perseverança, Dom Jacinto fez um chamamento para que nossa fraternidade não se perca mesmo nos tempos mais sombrios.

"É algo que nos põe no caminho, porque a fraternidade não pode ficar parada esperando que os outros venham", diz Dom Jacinto.

“Alegria. É realmente uma alegria. A gente saber que pode retornar àquela prática que já era muito firmada na nossa Arquidiocese de Teresina e dos arredores. Hoje podemos caminhar com alegria e com entusiasmo porque nós temos uma mensagem e ela não pode calar. É uma mensagem de fraternidade e ela é universal para quem crê em Cristo e para quem não crê. Para católicos e não católicos. Essa mensagem nós chamamos aqui de Caminhada da Fraternidade. É algo que nos põe no caminho, porque a fraternidade não pode ficar parada esperando que os outros venham. Nós vamos ao encontro dela e o caminhar, nossos passos com amor dizem essa disposição de seguir”, afirmou Dom Jacinto.

Para o arcebispo de Teresina, a felicidade do momento se traduz justamente na disposição das pessoas em estarem reunidas após dois anos de pandemia. Reunidas com um sorriso no rosto e mostrando boa vontade em agir em prol do próximo. A palavra que melhor define, disse o clérigo, é a esperança. Esperança em dias melhores.

É como se depois dos episódios dos últimos anos, as pessoas finalmente pudessem retomar a caminhada em busca da fraternidade que teve que ser interrompida. Nas palavras do padre Tony Batista, idealizador da Caminhada da Fraternidade: “estávamos atravessando uma tempestade. É como se o nosso barco estivesse em uma noite escura sem saber onde ancorar. É muito bom poder nos encontrar e saber que nos amamos, que somos igreja e queremos continuar a nossa caminhada. Caminhar é preciso. Perna para que te quero para caminhar no nosso abraço e na nossa alegria”.

Dom Jacinto Brito finalizou: “Caminhamos com mais velocidade e melhor quando estamos mais leves. Caminhemos com amor para que nossa fraternidade floresça”.

Da tristeza a gente faz a alegria

É através do abraço nos mais vulneráveis que a fraternidade e a fé movimentam as estruturas sociais, acolhendo aqueles que mais precisam. E, como diz o mandamento cristão, foi dando o amor - assim como Ele nos deu Seu amor -, mesmo nos tempos mais sombrios de pandemia, que os projetos sociais da ASA continuaram acolhendo a população em situação de vulnerabilidade, sejam aquelas vítimas de violência ou acometidas por enfermidades.

Ao todo, a Ação Social Arquidiocesana mantém ou apoia nove serviços dentre os quais se destacam o Centro Maria Imaculada, para cuidar de pessoas com hanseníase; o Lar da Misericórdia, que abriga pessoas com câncer; e o Lar de Santana, que acolhe idosos em situação de vulnerabilidade. Somente entre os anos de 2020 e 2021, os serviços sociais apoiados e mantidos pela ASA realizaram 38 mil atendimentos diretos apesar de todas as restrições impostas pela necessidade de se frear o avanço do coronavírus. Porque a caridade não existe somente em tempos de bonança. Ela se faz presente inclusive e sobretudo quando tudo à nossa volta parece trevas e ainda assim conseguimos com o pouco que temos e dentro das nossas limitações estender a mão e ajudar ao próximo.

Essa solidariedade e fraternidade se mostram nos gestos mais simples como, por exemplo, a participação na Caminhada. Todo o valor arrecadado com a venda das camisas da 27° edição é destinado aos serviços mantidos e apoiados pela ASA. É o que explica o Padre Isaías Pereira, coordenador da Caminhada da Fraternidade.

“Tudo que a gente faz de bem ou de mal nesse mundo, ele tem um efeito, tem uma consequência. Com a Caminhada da Fraternidade não é diferente. Quando você compra uma camisa, por mais que pareça um gesto muito pequeno, você não está simplesmente comprando a camisa. Você está participando de um ato de solidariedade muito grande. No ano de pandemia em que tinha muita coisa fechada, um ano em que foi difícil para nós, a ASA conseguiu manter seus atendimentos às pessoas que realmente precisam, às pessoas que não têm a quem recorrer. E quando você compra a camisa, você está estendendo a mão para essas pessoas, está contribuindo para esses atendimentos e para que a ASA continue a fazer aquilo que é o propósito dela: resgatar as pessoas do sofrimento e dar dignidade a elas, devolver um pouco de alegria para quem a alegria parece não existir mais”, diz o padre Isaías.

Um desses serviços sociais mantidos e apoiados pela ASA está o Lar de Misericórdia. Criado em 1990, sob os cuidados do então Arcebispo de Teresina, Dom Miguel Câmara, o Lar da Misericórdia acolhe pessoas em tratamento contra o câncer em Teresina. Ao longo das mais de três décadas de existência, a ação social tem realizado um trabalho não só de acolhida, mas de renovação da esperança, já que a casa é, muitas vezes, a única alternativa para os pacientes oncológicos, que não tem moradia ou referência na Capital, de continuarem o tratamento que é a sua chance de sobrevivência.

“Eu já ouvi pacientes dizendo que, se não fosse o Lar de Misericórdia, não faria o tratamento, ficaria no município somente tomando medicação para dor, porque não teria como pagar hospedagem em Teresina e por não ter parentes na Capital. Muitos não têm o que fazer, porque nos seus municípios não tem o tratamento contra o câncer e o município não tem casa de apoio”, lembra Lana Graziele, assistente social do Lar da Misericórdia.

A casa com capacidade para 30 pessoas está localizada na Avenida Dom Severino. O local conta com capela, refeitório, dormitórios, banheiros e amplos espaços de convivência. O jardim na entrada é apenas uma das mensagens de boas-vindas para as pessoas que deixam seus lares em busca da cura.

Atualmente, 16 pessoas são acolhidas no Lar de Misericórdia, entre pacientes e acompanhantes. Como é o caso da dona Aldenice Paulino, de 55 anos, paciente oncológica do Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Sem residência ou parentes em Teresina, dona Aldenice foi encaminhada ao Lar de Misericórdia pelo serviço social do HU. Moradora da cidade de Monte Alegre, no estado do Piauí, ela é acolhida no lar quando precisa vir à Teresina para fazer tratamento contra um câncer no intestino.

“Estou amando. Nas outras vezes que vim para Teresina fiquei internada, agora venho, passo alguns dias e vou para casa. Eu não sabia que a casa existia, quando fiquei sabendo, procurei a assistente social e ela me encaminhou. Sou evangélica, e já estive na capela rezando. Graças a Deus estou sendo muito bem recebida”, destaca.

Assim como dona Aldenice, muitos pacientes precisam enfrentar um longo tratamento para combater o câncer. Segundo a assistente social Lana Graziele, muitos frequentem o lar por mais de 10 anos e a casa acaba se tornando um segundo lar. Com a convivência diária, o vínculo afetivo permanece até depois de deixarem o Lar de Misericórdia.

“Temos aqueles pacientes que fazem a quimioterapia e a radioterapia e se sentem bem, mas precisam voltar a cada seis meses para fazer a revisão, então o vínculo continua. Acaba sendo uma segunda casa, os pacientes se apegam uns aos outros e também às pessoas da administração. Apesar de quererem ir para casa, muitos choram porque se sentem parte da casa. Inclusive, temos pacientes que já faleceram, mas os familiares continuam frequentando o lar porque fica aquele apego do tempo que passaram aqui”, destaca.

O trabalho desenvolvido pelo Lar de Misericórdia junto aos pacientes com câncer é a prova de que, a fraternidade, a solidariedade e a fé, são os instrumentos pelos quais curamos o mundo. A soma de todos os passos dados na Caminhada tem como resultado o sucesso de projetos que beneficiam centenas de pessoas assistidas pela Arquidiocese de Teresina. No caso do Lar de Misericórdia, os recursos arrecadados proporcionam que cada paciente consiga continuar o seu tratamento com dignidade e esteja, a um passo, da cura.