“Eu quero que a Gaudens represente a conexão entre a terra e o divino”.
É com essa pretensão que o empresário e chocolatier Fábio Sicilia elabora os produtos da Gaudens Chocolate, marca que utiliza cacau e insumos nativos da Floresta Amazônica.
A possibilidade de proporcionar prazer na degustação dos produtos levando a uma conexão com o sublime, fez Fábio escolher a palavra de origem latina que significasse orgasmo.
“Gaudens é felicidade plena”, expressa Fábio.
Essa preocupação com o nome é só um exemplo de como Fábio se entrega inteiramente a uma causa.
Ele está também envolvido na alavancagem do setor cacaueiro do Pará, estado onde fica a empresa. Faz questão de conhecer todos seus fornecedores para controlar a qualidade dos produtos.
assim também contribui para o desenvolvimento sustentável de toda a cadeia do chocolate, desde os extrativistas ribeirinhos até o consumo do produto final.
Mas a descoberta do mundo do chocolate aconteceu de forma inversa na vida do empresário.
O primeiro contato com a confecção de chocolates veio quando frequentou a Scuola Internazionale di Cucina Italiana, na Itália, em 2003. Ao voltar ao Brasil, passou a utilizar as técnicas aprendidas no restaurante no qual já era sócio com sua irmã Ângela, o Famiglia Sicilia, em Belém.
Na busca de produzir sobremesas com chocolate, começou a descobrir as riquezas da Amazônia paraense.
O cumaru, por exemplo, ele conheceu quando voltou da Europa, e hoje é o único aromatizante utilizado na Gaudens, sendo fruto da enorme diversidade do Pará.
O cacau, por ser nativo da bacia amazônica, já estava nas proximidades de Fábio, o que o encorajou a abrir, em 2004, sua fábrica de chocolate.
No entanto, a comercialização era feita apenas dentro do restaurante: ali foi criado o Brownettone!
A necessidade de aprimorar seu trabalho, o levou até Paris em 2014 para fazer o curso de chocolatier na École Lenôtre, uma das mais aclamadas escolas de arte culinária do mundo.
E foi neste mesmo ano que ele criou a Castella, o famoso creme de castanha-do-pará conhecido como a ‘Nutella da Amazônia’.
Foi a Castella que levou o nome da Gaudens para o mundo, inclusive sendo apresentada na Fiera Internazionale del Tartufo Bianco d'Alba, onde Fábio pôde mostrar o potencial gastronômico da Amazônia brasileira.
Hoje Fábio Sicilia conhece o mundo dos maiores chocolatiers da Europa ao mesmo tempo que entende a realidade do cultivo do cacau em seu berço.
Isso faz dele uma peça essencial para o reconhecimento do chocolate brasileiro como fonte de preservação ambiental, desenvolvimento econômico e valorização das comunidades tradicionais do Pará.
A Gaudens Chocolate é a prova que o Brasil vai muito além de um simples produtor de cacau.
O país está se revelando um grande fornecedor de sabores exóticos inseridos em produtos de qualidade, como os chocolates com cupuaçu e açaí da empresa.
O chocolate, nesse caso, é um meio que conecta não somente a vida terrestre da celestial, mas é um elemento que faz com que percebamos o quão valioso é o nosso território.
E pode ser também aquele ingrediente especial pra trazer um pouco mais de magia pro seu fim de ano...
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e tem mais histórias nesta edição:
- Quem disse que farofa não pode ser saudável? Essa paixão nacional ganhou cara nova - sem perder sabor!
- Ingredientes típicos da Amazônia são o segredo do sucesso de uma cerveja bem brasileira!
- Uma história que atravessa gerações: conheça a trajetória desse premiado queijo de búfala centenário!
- E conheça as razões que estão fazendo famílias trocarem a correria das cidades pelo campo!
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Farofa sem culpa
A farofa está presente de norte a sul do país, sempre acompanhando um prato regional...
Com churrasco no Rio Grande do Sul, moqueca na Bahia, peixe frito no Pará, a farofa faz parte da cultura culinária do país, e é consumida em todas as camadas sociais.
Entretanto, por ser feita basicamente de carboidrato e gordura, muitas pessoas a deixam de fora das refeições diárias.
Para tirar essa culpa no consumo de um alimento que carrega parte de nossa história, a nutricionista e chef funcional Samila Seki criou farofas nutritivas 100% naturais.
“Há seis anos, postei em minhas redes sociais que estava fazendo farofas mais nutritivas para mim, e que aceitava encomendas”, conta Samila.
Foi a partir dali que nasceu a Sekiama Alimentos da Amazônia, que hoje possui seis tipos de farofa:
- duas funcionais com sementes, incluindo castanha-do-Pará e caju;
- uma doce;
- e três tradicionais, com cebola, óleo de palma e sal do Himalaia.
A variedade de farofas veio com a intenção de atingir o número maior possível de pessoas, entre veganos, intolerantes à lactose e ao glúten, e alérgicos a castanhas.
A “farofamília”, como a própria Samila gosta de chamar, traz micronutrientes essenciais, sais minerais, vitaminas e fibras, geralmente não presentes em farofas feitas somente com farinha de mandioca e óleo vegetal.
Nascida em Belém do Pará, onde a farinha de mandioca é tradição inclusive no café da manhã, a nutricionista cresceu em meio às panelas.
Seu pai, descendente de japoneses, possui restaurante na cidade. Ainda criança, Samila era responsável pela farofa das refeições de casa, o que a tornou uma “farofeira master”, ri.
O fato de ter crescido em um estado de onde a mandioca é nativa, faz dela uma propagadora da cultura paraense.
Segundo o jornalista Caloca Fernandes, a mandioca surgiu no primeiro milênio a.C. na bacia do rio Amazonas e se difundiu para a América Central.
Acredita-se que antes mesmo do descobrimento do Brasil, os indígenas já haviam criado a farofa.
Para dar consistência mais pastosa e facilitar o consumo da refeição, que era feito com as mãos, as populações nativas misturavam a farinha de mandioca com carnes, e o aquecimento da gordura desses animais, juntamente com a farinha, teria dado origem à primeira farofa.
O fato é que por ser uma invenção 100% brasileira, a farofa é uma comida afetiva.
Mas para Samila, a farofa vai além disso. Como ela prioriza o uso de produtos locais, como gordura de palma, castanha-do-Pará e castanha de caju paraenses, as farofas Sekiama são um incentivo à economia amazônica.
A farinha de mandioca, principal ingrediente das receitas, é buscada pessoalmente pela empresária para garantir o padrão de qualidade dos produtos, que são feitos com farinha de maior granulometria, aquela em que a crocância está presente.
“Como nutricionista e chef funcional, eu aposto e acredito no equilíbrio alimentar”, explica Samila.
Da Amazônia, maior floresta tropical do mundo, a sabedoria popular já tirou inspiração pra uma infinidade de preparos culinários...
E se hoje as bebidas brasileiras têm usado cada vez mais elementos típicos regionais, Arlindo Guimarães e o filho Caio Guimarães têm grande contribuição nisso.
No ano de 2000 (quando o filho e futuro parceiro ainda era um menino), Arlindo decidiu ousar: o empresário do ramo de software quis investir dinheiro e muito trabalho numa antiga paixão, a cerveja.
Queria um produto que tivesse a cara do Pará, o sabor da Amazônia. assim nasceu a amazon beer!
Cervejeiro de carteirinha, sempre que viajava pra fora do país fazia questão de visitar bares e pubs de fabricação própria, experimentando tudo que havia de melhor na produção de cerveja.
E havia, sim, muita coisa boa. Só faltava a criação de algo especial. E bem brasileiro.
“O Brasil naquela época fazia cerveja imitando escolas alemãs, norte-americanas, belgas. Mas a gente não queria ser mais um no mercado. Até porque a gente está na Amazônia! Não tem tradição europeia aqui”, conta Caio Guimarães.
Caio, hoje com 33 anos, cresceu em meio à expansão da marca da família numa época em que as cervejas artesanais nem eram tão populares no Brasil.
Não deu outra: ele também se apaixonou pelo assunto e se juntou ao pai em 2011.
Além da cerveja, eles mantêm um bar na Estação das Docas, local turístico de Belém do Pará.
Hoje a Amazon Beer tem 7 rótulos, todos de ingredientes retirados da biodiversidade amazônica.
Toda a matéria-prima, como açaí, bacuri e taperebá, é comprada de pequenos produtores da região, o que ajuda a estimular a economia local.
O reconhecimento veio cedo na história da empresa e não parou mais!
Em 2011 a Amazon Beer foi eleita cervejaria do ano pela revista Prazeres da Mesa, e desde então coleciona medalhas em concursos nacionais e internacionais.
A maior vitória até hoje foi em 2014, quando a ousada Stout de açaí foi campeã no Concurso Brasileiro de Cerveja realizado em Blumenau, Santa Catarina.
Foi a coroação da bebida que leva na formulação o ingrediente que é marca registrada da Amazônia.
Símbolo de saúde e sabor tropical, o açaí logo ganhou o coração dos cervejeiros. O rótulo virou o queridinho entre os clientes da marca e passou até a ditar moda!
“Quando a gente ganhou o prêmio com essa stout, vários cervejeiros nos relataram que passaram a fazer cervejas também com ingredientes locais. Isso despertou a curiosidade das pessoas”, diz Caio.
Outros produtos da floresta como a priprioca e a semente puxuri também ganham destaque nas elaborações.
A IPA, por exemplo, traz a tradicional erva indígena chama para a composição. Ingredientes que muitos brasileiros sequer conhecem e no entanto são patrimônios nacionais.
Esses rótulos são vendidos de norte a sul do Brasil e também no exterior.
É possível encontrar as garrafas de Amazon Beer em prateleiras do Japão e até da Inglaterra - lá na terra da rainha, uma fábrica local é autorizada a produzir e distribuir os rótulos dentro do país.
Caio sabe que esse sucesso significa a valorização dos agricultores locais e da própria floresta Amazônica...
Queijos de origem amazônica feitos com leite de búfala. Parece delírio, mas a história não engana...
É aqui, na foz do rio Amazonas, que nossa história começa há 125 anos...
Mas antes mesmo da chegada dos animais ao Marajó, as famílias de Cecília e Marcus Pinheiro já produziam queijo para consumo próprio. Eles são proprietários da Fazenda São Victor e produtores do Queijo do Marajó Tipo Creme.
Os primeiros antepassados do casal, que faz parte da nona geração na ilha, chegaram ao Marajó vindos de Portugal em 1762. “A produção de queijo para venda começou lá por 1920”, conta Cecília.
Ela chegou a essa conclusão após encontrar um caderno de compra e venda escrito em francês pertencente à sua bisavó.
Não é de se estranhar o uso da língua francesa, já que os europeus que chegavam ao Pará vinham de Portugal e França, e a tradição queijeira do Marajó deve-se à introdução da cultura deles na região.
Com a chegada dos búfalos à ilha, o leite de vaca foi substituído pelo de búfala, em um processo que é reproduzido há 250 anos, sempre com leite cru.
Neste ano, Cecília e Marcus foram os primeiros no Pará a serem concedidos o Selo Arte pela produção do Queijo de Búfala Tipo Creme.
Essa é apenas uma parte da história do casal, que se uniu para produzir um queijo que traz consigo a paixão por sua terra, e quer levar ao mundo um produto único, que seja reconhecido pela sua qualidade.
O Queijo de Búfala Tipo Creme da Fazenda São Victor é um produto 100% natural.
Isso porque os animais se alimentam de pasto nativo, com diferentes espécies de capins, o que dá ao queijo um sabor amadeirado.
Por causa dessa variação na dieta do animal, o mestre queijeiro precisa ter experiência para equilibrar os sabores e, por trabalhar com um processo totalmente artesanal, conseguir manter o padrão dos queijos.
Luís Ferreira Leal, que aprendeu a profissão com o pai aos nove anos de idade, é o responsável pelos queijos da empresa.
Os únicos ingredientes utilizados são leite de búfala e sal.
O restante, técnica transmitida oralmente, com a utilização de desnatadeira e adição do creme do leite do animal no momento certo.
O reconhecimento da dedicação ao rebanho e do respeito às tradições veio em forma de prêmios importantes!
Em 2018 o queijo da Fazenda São Victor recebeu o Super Ouro na quarta edição do Prêmio Queijo Brasil em São Paulo, onde concorreu com 500 queijos artesanais do Brasil inteiro.
E ano passado foi Prata na IV Edição do Mondial du Fromage et des Produits Laitiers, na França, onde mais de 900 queijos de todo o mundo estavam presentes.
Infelizmente esse combo conhecido já é a rotina normal das grandes cidades.
Mas esse normal não agrada todo mundo. É justamente a rejeição a esse estilo de vida que tem motivado muitas famílias a uma mudança drástica...
Ir viver no campo!
Mesmo famílias que nunca tiveram contato com a terra vêm sentindo necessidade de buscar essa mudança. Diferente do êxodo rural que marcou as migrações no Brasil na segunda metade do século passado, o êxodo urbano não busca melhores condições econômicas.
A busca, nesse caso, é por qualidade de vida e sustentabilidade.
Mas esse não é um movimento novo...
O neorruralismo, ou contra-urbanização, teve uma primeira onda na década de 60 em alguns lugares do mundo como Europa e América do Norte.
É um ímpeto de contracorrente, de voltar às raízes rurais do passado, buscar mais espaço e liberdade através do contato com a terra.
Hoje a ideia volta a fazer parte da vida de muitas famílias. É a história da Nicole Contini, de 39 anos.
Nascida nos Estados Unidos, ela conheceu o marido brasileiro em Nova York e há 11 anos vive com ele em Santa Catarina.
Os filhos, Leonardo, de 6 anos, e Cecília, de 1 ano e 5 meses, nasceram em Florianópolis no meio de uma rotina familiar agitada: ela, diretora de uma escola de inglês; o marido Leonardo, gerente em um hotel. O tempo era curto.
A vinda dos filhos mexeu com os planos do casal.
Eles decidiram vender a casa, deixar os empregos e mudar pro interior de Santa Catarina. Compraram um pedaço de terra em Joaçaba e agora constróem a casa que sempre sonharam:
cercada de verde e com bastante espaço pras crianças brincarem!
“Todo mundo nos chamou de loucos. Tínhamos um estilo de vida em Floripa que seria difícil reproduzir aqui. Mas sabe? Eu senti que era a história certa pra nós.”
Mas antes que pensem que tudo foi simples, a Nicole deixa bem claro: “Se você está imaginando uma família hippie, pense de novo!”.
Bem humorada, ela conta as vitórias e agruras da nova vida no campo. A norte-americana que nunca tinha sequer acampado antes se diverte dizendo que já matou metade das plantas que plantou na propriedade...
mas sabe que tudo é um processo de aprendizagem.
Alguns cultivos estão dando certo e ela se orgulha de já colher as próprias frutas e fazer o próprio pão. E olha que essa ainda é a menor das vantagens.
No campo, a família Contini também descobriu o sentimento de comunidade que tanto buscava na cidade.
De vizinhos queridos que presenteiam com pêssegos deliciosos, até o contato mais direto com a família do marido Leonardo que mora em Joaçaba, tudo contribui pra que a nova vida faça mais sentido...
Mas muito mais do que os novos amigos ou a vizinhança dos sogros, o que fez o ruralismo ganhar mesmo o coração da Nicole foi ver a felicidade dos filhos.
“É incrível ver as crianças no campo. Eles sabem de onde vem a comida deles e estão aprendendo muito sobre o ciclo de vida, uma coisa que eu nunca imaginei que pudesse oferecer pros meus filhos”, conta Nicole.
tudo isso deixa ela com a certeza de que a mudança de rumo foi o melhor caminho...
Se você é produtor e também tem histórias cheias de sabor, conta pra gente:
outros temperos
Quer aprender receitas com ingredientes diferentes?
O livro Culinária Selvagem - saberes e receitas de plantas alimentícias não convencionais, acaba de ser lançado. O livro foi produzido pelo Laboratório Horta Comunitária Nutrir (LabNutrir), da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E reúne informações botânicas, nutricionais e culinárias de 12 PANCs estudadas pela comunidade do laboratório.
Vem aí o ‘Festival Fartura Gastronomia Du Brasil’:
O evento será entre os dias 11 e 13 de dezembro. O Festival terá formato inovador, com conteúdos online e experiências físicas, que acontecerão, simultaneamente, em todas as regiões brasileiras.
Já sabe o que dar de presente nesse Natal?
O Comida com História tem uma sugestão: quer tal incentivar a produção nacional de alimentos e presentear com os sabores do Brasil? A Feira Sabor Nacional, que desde 2015 reúne pequenos produtores de alimentos, bebidas e acessórios culinários, terá uma edição natalina nos dias 11, 12 e 13 de dezembro.
Mais um evento gratuito para fechar 2020:
O Mesa Regeneração vai reunir chefs, produtores rurais e pesquisadores, com o objetivo de promover a conscientização ambiental por meio da gastronomia e da ciência. O evento será online nos dias 10, 11 e 13 de dezembro.
E que tal cozinhar algo bem brasileiro nesse fim de ano?
O Instituto Brasil a Gosto disponibiliza em seu site receitas que são a cara do Brasil. O Instituto é um instrumento de difusão da cultura nacional através da gastronomia. Ele estimula projetos que valorizem os ingredientes nacionais e garantam sua acessibilidade ao público.