«Queremos abrir o bairro ao mundo mas também trazer o mundo ao bairro» - Mário Linhares, coordenador do projeto ‘Zambujal 360’
Lisboa, 13 jul 2023 (Ecclesia) - Mário Linhares, coordenador do projeto ‘Zambujal 360’, no concelho da Amadora, contou à Agência ECCLESIA que este projeto quer “transformar o bairro”, “dando oportunidades aos jovens e combatendo a solidão dos mais velhos”, onde os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável ganham destaque através de um percurso.
“Zambujal 360 é um projeto que tenta desenvolver o bairro todo e quer dar estímulo o comércio local, envolver moradores e trabalhar para educação dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS); em modo geral é dizer que vamos ter 17 pinturas de arte urbana dedicadas a cada um dos ODS, num percurso ligado pela ciclovia do bairro”, explica Mário Linhares em declarações à Agência ECCLESIA.
Uma das fases do projeto tem sido “sonhar com os mais jovens”, dando a conhecer o bairro social que “precisa de ser conhecido e valorizado”.
“Com a população mais jovem, a arte urbana é mais apelativa aos jovens, ter um bairro com uma galeria de arte urbana pode trazer pessoas ao bairro, começámos a dar-lhes formação sobre os ODS, a conhecerem os artistas, a revelar que o bairro teve um projeto de arquitetura, que é premiado, e depois que podem eles apresentar a quem nos visita, serem os guias deste circuito e possam transmitir tudo isto que é a história do bairro”, indica.
Em ano de Jornada Mundial da Juventude a acontecer em Lisboa, na semana 01 a 06 de agosto, Mário Linhares reconhece que “não podiam ficar à margem”.
“NÃO FAZIA SENTIDO ESTE PROJETO FICAR À MARGEM DA JMJ E QUEREMOS DAR POSSIBILIDADE AOS JOVENS DE PODEREM PASSAR POR AQUI, SONHÁMOS TER TUDO PRONTO PARA A ALTURA DA JMJ MAS NÃO É POSSÍVEL TER AS PINTURAS TODAS PRONTAS E TAMBÉM PODE SER INTERESSANTE VIREM E VER ALGUMA EMPENA PINTADA, VEREM ARTISTAS A PINTAR E UM DIA MAIS TARDE QUE PASSEM POR LISBOA, POSSAM VOLTAR”, DEFENDE.
O responsável pelo projeto conta com a visita dos “jovens que vão ser acolhidos na zona de Alfragide, que vão ter informação direta” e também dos jovens acolhidos “na zona da Amadora”, além disso nos dias da JMJ também os “Missionários da Consolata estarão a promover o projeto”.
As 17 empenas (fachadas laterais dos prédios) estão a ser pintadas por artistas diversos, “convidados e contratados”, sobretudo com técnicas diferentes para que a “arte urbana não fosse sempre do mesmo estilo”.
“Temos parcerias que nos ajudam nos gastos com as pinturas e escolhemos artistas diferentes, teremos por exemplo uma artista que trabalha em cerâmica, uma tradição bem portuguesa; um ilustrador que vai ter aqui a sua primeira obra de arte urbana e destaco ainda o artista Das Neves, que é do bairro, e trabalha técnica mista”, revela.
Com o “slogan ‘queremos abrir o bairro ao mundo, mas também trazer o mundo ao bairro”, os leigos missionários da Consolata e a associação CAZA são os promotores desta iniciativa que quer que haja “um motivo forte para visitar o bairro”, com “alguém que recebe e apresenta a arte e os artistas”.
Mário Linhares reconhece que a presença dos Missionários e Missionárias da Consolata, há 20 anos no bairro, “criou uma relação de confiança”, depois com a ligação à CAZA, permitiu pensar e sonhar “este projeto que vai beneficiar a comunidade”.
“Começámos por fazer um inquérito de diagnóstico a saber o que as pessoas achavam mais importante e daí percebemos que era bom dar a conhecer o comércio local e a vida de bairro, trabalhar com a população mais idosa, fazer caminhadas e ganhar mobilidade, conhecerem novos vizinhos”, descreve.
Segundo o coordenador do projeto, “antes de cada pintura” há uma reunião com os moradores daquele prédio e o artista, “para que os moradores sejam envolvidos” e tem sido “incrível a mobilização” e o feedback de interação com os artistas.
Das Neves, um artista do bairro
Pedro das Neves vai dar vida à fachada com o ODS 6 “água potável e saneamento”, ficou “muito contente com o convite” e tem “três ou quatro ideias” para selecionar.
“Eu já tenho pensado algumas coisas mas, além de pintar a fachada, vai ter outra dimensão, a minha empena vai-se mexer”, promete o artista em declarações à Agência ECCLESIA.
O entrevistado tem formação em relojoaria, trabalha em “transformação de espaços interiores” e afirma que a inspiração vem “da família, esposa e filhotes”.
“Vim para o bairro já grande, em 1998, estava cá só ao fim-de-semana, porque era interno num colégio, a minha ligação ao bairro foi lenta e progressiva, mas intensa, até aos dias de hoje”, partilha.
Depois da timidez inicial, Pedro das Neves revela que o bairro é um espaço muito especial, “por várias razões”.
“A minha ligação especial ao bairro, tem a ver com a família, foi aqui que encontrei a minha esposa, que é de etnia diferente, é uma longa história, difícil mas superada, o bairro e proximidades foram o nosso lugar de namoro”, explica.
Em jeito de brincadeira, o artista recorda que teve de fugir do bairro com a então namorada “duas vezes”, casou três vezes, “conforme a comunidade, pelo registo e depois na Igreja” e agora orgulha-se dos “quatro filhotes”.
“Namorámos às escondidas, a minha esposa é de etnia cigana e não era aceite, mas fomos fazendo caminho, hoje temos uma vida tranquila, damo-nos todos bem, e os quatro filhos provam o nosso amor, todos em harmonia, a maioria dos familiares são habitantes do bairro”, descreve.
Pedro das Neves contava a sua história de amor no bairro como forma de enaltecer o espaço que deseja ver “com futuro sorridente e colorido” e onde vai ter a sua “primeira peça no exterior”.
“Vejo um futuro sorridente e colorido para o bairro, e insisto que seja animado, pelas fachadas de cada artista, isto vai mudar o bairro”, deseja.
Na pintura da fachada virada ao IC 19, o artista promete ter “a companhia dos filhotes”, porque já vão tendo “jeito para o desenho”.