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A potência que vem das mulheres Revista Comida com História

Olá!

Seja bem-vindo à revista digital Comida com História, um universo de pessoas, tradições e boas histórias em torno da mesa.

Essa revista é diferente e digital porque foi feita especialmente para você ler no seu aparelho celular.

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Através do programa Inovatur, com apoio da Setur (antiga Santur) e da Fapesc, 6 edições levarão você a diversos cantos de Santa Catarina através de pequenos produtores de comida artesanal e profissionais que fazem do turismo gastronômico uma experiência inesquecível.

Nesta 2ª edição, você vai conhecer histórias inspiradoras de mulheres que desenvolveram experiências únicas em turismo e gastronomia.

Boa viagem e bom apetite!

Então vamos botar a mesa?
Veja o cardápio dessa edição:
Chácara clara noite de sol

Elas abriram as portas da chácara onde moram para mostrar a beleza e os sabores da produção de cogumelos.

experiência Café & Madeira

Conheça o passeio que oferece natureza exuberante, mesa farta e um mergulho na história da serra Dona Francisca.

cachaçaria dona nelva

Conheça a mulher que precisou de muita força para superar dificuldades e produzir cachaça em meio à natureza.

Quilombo morro do fortunato

Uma história de resistência é preservada através da valorização de suas tradições na roça e na cozinha.

Boa leitura!

No reino dos cogumelos

Para além dos animais…
E das plantas…
A natureza também guarda outros seres complexos, de beleza única e importância enorme pro ecossistema.

Os cogumelos parecem flores, mas não são.

Parecem frutos, mas não são.

Geneticamente se aproximam até dos animais, mas na verdade são fungos e criam um universo todo próprio para existir.

O encantamento por esses seres fez uma bióloga e uma designer mudarem completamente de vida, da cidade para o campo, e se dedicarem ao cultivo de cogumelos na Chácara Clara Noite de Sol.

O terreno, localizado no bairro Ratones, zona rural de Florianópolis, em Santa Catarina, foi comprado pela família de Leilen Monti (à direita na foto acima), que decidiu se mudar pra lá com a esposa, Juliana Conceição.

Juntas, mergulharam intensamente no reino dos cogumelos.

"Fungos são seres incríveis, recicladores naturais de matéria orgânica.“

“Tem fungo decompondo óleo diesel, derramamento de petróleo, matéria orgânica nos rios, oceanos. Eles estão revolucionando até a indústria de materiais", diz Juliana.
Na Chácara, se cultiva o micélio, a parte mais importante do fungo.

O micélio, que quase sempre está embaixo da terra ou sob algum tronco caído, absorve os nutrientes da natureza e então faz brotar os cogumelos como se fossem os frutos coloridos de uma árvore.

Viver esse processo era tão apaixonante que as produtoras decidiram não guardar só pra elas: depois da pandemia, abriram a casa para visitas.

Através de formações do Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) e uma consultoria do Sebrae, que ajudou todo o grupo de produtores do bairro Ratones a criar uma rota turística, Leilen e Juliana elaboraram uma vivência completa em torno dos cogumelos.

A experiência começa com uma pequena aula sobre fungos, inclui passeio à propriedade, visita ao histórico Rio Ratones e uma atividade na estufa onde a pessoa pode colher os próprios cogumelos.

E tem para todos os gostos:

Do tradicional shimeji ao exótico cogumelo salmão.

Tudo termina na cozinha, onde há troca de dicas, receitas e uma degustação dos cogumelos frescos recém preparados.

O projeto existe há um ano e já recebeu gente de todos os cantos do mundo.

"As pessoas se encantam ao conhecer as possibilidades e funções dos fungos. Se encantam com a interação direta da colheita e depois com os sabores experimentados no prato."

Juliana Conceição

E embora Juliana cultive vários tipos de cogumelos, ela tem o seu favorito: o Fênix.
Uma bela metáfora para o reino dos fungos, que também recomeça a cada ciclo de cogumelos, trazendo beleza e renovação para a natureza ao redor.

Quer saber mais?

Ratones é um dos últimos redutos rurais de Florianópolis. A área integra a maior Bacia Hidrográfica do município.
aqui começa uma nova história

Estrada Dona Francisca: sabor com história

Fotos: Daniel Machado

Percorrer a Serra Dona Francisca é ter a possibilidade de reviver a história da segunda via carroçável do Brasil.
A formação montanhosa, localizada no norte do estado de Santa Catarina, virou Área de Proteção Ambiental em 1997, sendo um dos últimos redutos de Mata Atlântica do país.
É na beira dessa rodovia, ainda em terras joinvilenses, que Luciane Rank Maia serve produtos artesanais e coloniais na experiência Café & Madeira.
O AVÔ DE LUCIANE, ALFREDO RANK, COMPROU A PROPRIEDADE QUE HOJE É O SÍTIO CANELA PRETA EM 1939.

Servido no antigo galpão onde era feita a secagem da madeira da serraria em anexo, o café é um mergulho na história da Estrada Dona Francisca.

Foi ali que trabalhou durante muitos anos com a abundante madeira canela preta, atividade que depois foi tocada pelo pai de Luciane, e que ela finalizou após o seu falecimento.

“Meu sonho ainda é transformar a serraria em um museu”, diz.

A serraria é a última nesses moldes ainda existente na estrada, e os visitantes que vão até o sítio para conhecer o espaço, presenciam uma demonstração do funcionamento do maquinário, que sempre foi movido à água.

A Serra Dona Francisca abriga grande parte das nascentes dos rios que abastecem as cidades litorâneas catarinenses.

Por isso, serrarias e engenhos de beneficiamento de erva-mate, principais produtos escoados pela estrada a partir da segunda metade do século 19, se instalaram ao longo da estrada. A vontade de manter a trajetória da família enquanto oferece produtos feitos por ela, seu marido, cunhado e produtores da região cresceu durante o curso de Turismo.

“Fui me apaixonando pelo ecoturismo e turismo rural”, conta Luciane.

Ao fazer seu TCC sobre turismo rural em Campo Alegre, município que também é atravessado pela Estrada Dona Francisca, conheceu um casal que produzia queijos boursin, um queijo cremoso de origem francesa feito com leite de cabra.

Seu Ângelo e a esposa passaram a receita para Luciane , e hoje é um dos produtos da Dona Cabra Laticínios, de propriedade da família.

Além do boursin, do iogurte e de outros produtos da marca, o café que Luciane serve conta com doces e biscoitos que são receita da mãe dela, suco da sua plantação agroecológica de amora e pães feitos por ela.

“Eu tomo café junto com os visitantes, conto como é feito o queijo que o Seu Ângelo padeceu pra chegar à receita atual”, explica.

“QUEM VEIO E CONHECEU O QUEIJO AQUI, HOJE VIROU CLIENTE”.

Dá para entender, afinal como resistir a essa mesa farta?

Um final delicioso pra essa experiência que ainda inclui a contemplação da Cachoeira da Serraria, que passa pela propriedade.
“As águas que moviam a serraria hoje movem o turismo”, complementa ela.

E o turismo é o que move Luciane, que além de trabalhar em seu sítio, presta assistência técnica para outras propriedades rurais que trabalham no segmento.

Quer saber mais?

A experiência Café & Madeira faz parte da rota Caminhos de Dona Francisca, que inclui engenhos, alambiques, restaurantes, pousadas, e muito mais!
AQUI COMEÇA UMA NOVA HISTÓRIA

A força de uma mulher no caminho das águas

Fotos: Angélica Luersen

Essa é uma história sobre força e perseverança.
Em um lugar onde a força da água abriu passagem e criou lindas cataratas, vive uma mulher que também precisou superar muitos obstáculos.

E com coragem, virou produtora de cachaça.

DONA NELVA DALSASSO ESCOLHEU ESSA ATIVIDADE DEPOIS DE SE DIVORCIAR E FICAR COM UM PEDAÇO DE TERRA PARA SI.
É NELE QUE PLANTA e colhe A CANA, FAZ A CACHAÇA, E ONDE DEU INÍCIO, HÁ ALGUNS ANOS, À PRODUÇÃO DE LICORES COM FRUTAS DO PRÓPRIO SÍTIO.
Dona Nelva produz as cachaças em um recanto rural em Quilombo, no oeste catarinense, onde fica o Salto Saudades.
Também conhecido como as mini cataratas do iguaçu, é um dos principais atrativos naturais da região.
Foi nessa cidadezinha que Dona Nelva cresceu vendo os homens da família produzirem cachaça.

A bebida era produzida para consumo entre familiares e amigos. Muito diferente da realidade dela pós separação, quando ela mesma precisou assumir a produção para sobreviver.

“Não tinha outra alternativa, precisava ganhar dinheiro”, conta.

Com o apoio dos filhos, sendo um deles agrônomo, o plantio de cana começou rendendo 500 litros de cachaça. Pouco a pouco a produção foi ganhando volume, e atualmente chega a uma média de 25 mil litros anuais.

Tudo produzido somente por ela.
Durante 10 anos a cachaça foi seu carro-chefe. Vendia a branca e a envelhecida para municípios no entorno de Quilombo.

Mas a vontade de inovar e aproveitar as frutas do sítio fez com que começasse a fazer licores. Tangerina, ameixa, menta e jabuticaba estão entre os 12 sabores que produz. “Eu faço a colheita e guardo a essência da fruta na cachaça”.

Com isso, durante o ano todo consegue ter à venda licores de frutas que já estão fora da estação.

Além de suas receitas de licores, reproduziu o vinho quinado de seu pai, uma mistura de vinho com cachaça que ganhou o nome de Vinho Quinado do Vô Valentin.

Os produtos também incluem grappa e campari.

As lembranças do modo de fazer cachaça do pai, um curso para aprimorar a produção e a fé que tem em Deus conduziram Dona Nelva ao lugar que está hoje.

“Sempre tive força de levantar e trabalhar o dia todo”, relata.

As dificuldades do divórcio ficaram no passado, o nome da Cachaçaria Dona Nelva foi ficando conhecido, e os turistas que iam a Quilombo ver o Salto Saudades começaram a passar por sua propriedade para degustar as bebidas.

“Uma coisa foi puxando a outra”.
Hoje, a cachaçaria faz parte da Rota Encantos Rurais de Quilombo.

As propriedades rurais dessa rota recebem turistas para atividades que resgatam e preservam as características singelas do campo. Aquelas ligadas a riachos, jardins de flores, barris de vinhos, canteiros de hortaliças e alambiques de cachaça.

Uma verdadeira imersão em lugares onde a natureza converge com o trabalho humano.

No espaço onde Dona Nelva recebe os visitantes, um caminho cercado de árvores e um lago dão as boas-vindas. Lá, eles conhecem sua história, visitam a produção de cachaça e provam os produtos que ela faz sem a ajuda de ninguém.

Além das bebidas, oferece a geleia de figo feita no tacho, mais uma receita do pai.

Desde 2017, quando deu início às atividades turísticas, recebeu gente de muitos lugares do Brasil e até de outros países, como a Itália. “O turismo aumentou muito minhas vendas”.

Aos 65 anos, Dona Nelva diz que sempre acreditou na sua capacidade.
“A mulher é muito forte, tudo o que quer, consegue”.

E COMO DUVIDAR DAS PALAVRAS DE QUEM FEZ ACONTECER?

Quer saber mais?

A Cachaçaria Dona Nelva é a última parada da Rota Encantos Rurais de Quilombo.
AQUI COMEÇA UMA NOVA HISTÓRIA

O sabor da resistência

Vamos voltar no tempo?
Na antiga Freguesia de Garopaba, no final do século 19, nascia um homem chamado Fortunato Justino Machado.
Filho de Joana, uma mulher escravizada, Fortunato nasceu a tempo da Lei do Ventre Livre.
A liberdade do menino significou o começo de uma história de luta e resistência num local que até hoje leva o nome dele: Morro do Fortunato.

Localizado a 8 quilômetros do centro de Garopaba, o pedaço de terra foi onde o filho de Joana iniciou um Quilombo, reunindo ex-escravizados e seus filhos pela sobrevivência e preservação da sua identidade.

Mais de um século depois, hoje a história é mantida por 50 famílias descendentes.

A Comunidade Remanescente de Quilombo Morro do Fortunato não preserva apenas as terras conquistadas pelos antepassados, como também suas tradições na roça e na cozinha.

Doces feitos de fruta nativa e pão caseiro são algumas das iguarias produzidas em grupo.

Quem conta é Mercedes Machado, bisneta de Fortunato. Ela tem orgulho de falar sobre as raízes e luta pela vida do Quilombo até a posteridade.

"A gente não pode deixar morrer essa história e essa cultura. Temos que continuar a tradição dos mais velhos pros mais novos."

Mercedes Machado

Nos últimos anos, os moradores passaram a levar a tradição para pessoas de fora do Quilombo, através de visitas guiadas. Grupos de turistas, estudantes e professores são recebidos para aprender sobre a figura de Fortunato e a história daquelas terras.

O tour inclui visita à horta e ao plantio de frutas como laranja, amora e banana - que depois viram geleias de receita familiar.
"Tem jabuticaba nativa, plantada na época do meu pai, todo ano dá e a gente colhe pra geleia.", diz Mercedes.

Ela também é apaixonada pela geleia de tangerina com casca: "é bem gostosa, a gente pega ela e tem aquela casquinha, aí bota num pãozinho ou no biscoitinho… Ah, é uma maravilha!"

Os turistas também podem ficar para o almoço ou café da tarde, se estiver previsto na visita.
Antes de ir embora, ainda podem comprar as inúmeras delícias da casa.

Os produtos das marcas Delícia na Mesa e Doce do Fortunato também são vendidos no Mercado do Produtor, em Garopaba.

E comprados pelo município para a merenda, através do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
Apesar de fazer sucesso, a venda ainda não é suficiente para manter as famílias.
As doceiras dividem a cozinha com outras atividades comunitárias, como a escola de jovens e adultos.

Agora elas sonham com a construção de uma cozinha própria e maior, especial para a agroindústria. O passo, que está próximo, pode significar maior independência financeira.

Uma maneira de seguir garantindo o futuro do Quilombo… e do sabor das receitas tradicionais.

Quer saber mais?

o Quilombo Morro do Fortunato, em Garopaba-SC, foi certificado como remanescente de quilombo em 2006 pela Fundação Cultural Palmares.
Esperamos que você tenha gostado de acompanhar essas histórias cheias de sabor neste novo formato.

Até a próxima edição!

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